quarta-feira, 19 de maio de 2021

Pés: por que treinar descalço?

 


Desenvolvimento motor

A criança conhece o mundo pelos pés e mãos, então, ao ser calçada, ela fica privada de uma parte essencial da exploração, podendo ter prejuízos em seu desenvolvimento, tanto motor quanto cognitivo. Durante a infância acontece o período de amadurecimento neuro-sensório-motor e a cada nova experiência padrões de controle postural e de equilíbrio são aperfeiçoados. Além de deixar as crianças com pés descalços sempre que possível, também é interessante permitir que experimentem diferentes tipos de solo (areia, terra, grama…) e, se o chão frio for um problema, vista nela uma meia que a esquente, mas ainda permita mais movimentos que o sapato permitiria.

Isso também vale para os adultos, se não estiver em um ambiente formal ou com alto potencial de lesão na sola dos pés, prefira estar descalço o máximo possível. A manutenção dos padrões táteis de exploração e desenvolvimento motor são de extrema importância para a realização das atividades diárias da vida adulta de forma eficaz. Comece se acostumando com as texturas do chão em casa, depois estenda até a praia, com caminhadas descalço na areia, ou no sítio, enquanto anda pelo gramado. Quanto mais você puder estimular a planta do seu pé, melhor. 

Equilíbrio e postura

Enquanto você anda descalço exercita itens importantes, como equilíbrio e postura. Os receptores sensoriais presentes nos pés são as estruturas responsáveis pela exploração e reconhecimento do ambiente, com capacidade de transformar um determinado estímulo tátil em impulso nervoso. Essa sensibilidade plantar desencadeia reflexos de propriocepção (equilíbrio), permitindo que as informações vindas dos receptores podais sejam processadas pelo sistema nervoso central (SNC) e transmitidas aos músculos, auxiliando no desenvolvimento de força muscular e coordenação motora. 

Por haver uma grande quantidade de receptores sensoriais nos pés, a região é considerada um segmento de captação postural, informando constantemente o SNC sobre as posições que nosso corpo adota durante todo o dia nas posturas estáticas e dinâmicas ao realizar ajustes compensatórios aos estímulos externos. Esse sistema de respostas aperfeiçoadas torna os pés uma excelente ferramenta de equilíbrio, assim, fica claro que sua anatomia e sensibilidade à pequenas deformações no solo tem uma função extremamente importante na marcha, na postura estática e também durante as posturas dinâmicas do dia a dia. 

Quadros de enfermidade, como neuropatias periféricas (danos nos nervos dos pés, por exemplo), além de comprometer a sensibilidade podal, também alteram o tempo de ativação muscular, dificultando o controle postural. Assim, fica claro entender que todas as relações plantares colaboram com o equilíbrio e são priorizadas pelo SNC para manutenção do movimento corporal correto. Além disso, o envelhecimento naturalmente altera o sistema nervoso, diminuindo a sensibilidade podal e, com essa limitação de informações sensoriais, podemos entender o porquê do pior controle postural e de equilíbrio em pessoas com idade mais avançada. E nesses casos, é ainda mais importante andar descalço.

Linha superficial posterior

Um grande avanço para os profissionais do movimento foi o estudo atual sobre trilhos anatômicos. Thomas Myers descreveu como linhas que percorrem nosso corpo com a função de manutenção da postura, composta por grupos musculares que possuem uma ligação entre si. Enquanto o sistema de fáscias reveste nossos sistemas e estruturas, as linhas conectam músculos e ossos, criando uma continuidade em todo nosso corpo. Além disso, os trilhos podem transmitir força, como se os músculos fossem condutores enquanto a fáscia é responsável por direcionar essas forças. Uma contração gerada no glúteo pode ser conduzida para o tronco e entregue de forma potente até os braços, por exemplo. 

A Linha superficial posterior é uma dessas linhas descritas nos trilhos anatômicos, começando na fáscia plantar dos pés, seguindo por trás das pernas, tronco e terminando na fáscia epicranial da testa. Ela é responsável por conectar toda a superfície posterior do corpo, literalmente da planta do pé ao topo da cabeça, o que nos possibilita manter a posição em pé sem cair à frente. Qualquer disfunção nas regiões que fazem parte dessa linha, seja de encurtamento ou fraqueza, desencadeia alterações posturais significativas que podem acabar em lesões e dores. Realizar exercícios com essas alterações pode ser prejudicial, por isso, a liberação miofascial de toda a planta do pé é uma excelente ferramenta para ganho de harmonia entre as linhas anatômicas, permitindo movimentos mais fluidos e corretos. Essa liberação pode ser feita de forma manual ou com acessórios, mas vale reforçar que, ao caminhar descalço, as texturas e deformidades do solo podem realizar esse estímulo de forma passiva. 

Reflexologia 

A reflexologia é uma outra técnica muito eficaz, da medicina complementar, podendo prevenir e tratar disfunções, além de aumentar o relaxamento, melhorar o sono e promover bem-estar emocional e físico. Esse tipo de massagem utiliza pressão dos polegares em pontos específicos do pé que correspondem a órgãos e várias outras regiões de todo o corpo. É importante reforçar que não substitui o tratamento tradicional e a prática de exercícios, mas pode ser usado por todas as pessoas para diminuir dores e tratar desde disfunções físicas, até ansiedade e depressão. 

Exercícios para os pés

Diferentemente do que muitos pensam, o pé não é uma estrutura rígida. Temos diversos músculos podais, o que torna a região treinável. Logo, podemos evitar dores por meio de exercícios. Esses músculos são responsáveis por manter o arco plantar, estrutura em forma de curva, localizada na parte de baixo do pé que distribui a pressão entre as diferentes áreas plantares e dissipa energia, minimizando os impactos nas articulações. Ao deixar seu pé preso dentro de um sapato durante muitas horas seguidas, há prejuízo nesse sistema de amortecimento e absorção de impacto. Você conhece alguém com pé “chato” ou já ouviu falar em fascite plantar, por exemplo? Estes e vários outros problemas podem ser prevenidos e tratados quando melhoramos a mobilidade e força dos pés, ou seja, pé plano não é imutável pela genética e fascite não se resolve somente com uso de palmilhas nos calçados. Qualquer alteração na curvatura plantar pode causar dores e o melhor remédio é estimular a região com diferentes movimentos. 


Conclusão

Depois de entender que os pés foram preparados para receber estímulos táteis para reconhecimento do mundo e que os receptores podais funcionam como captores posturais para manutenção da postura estática e dinâmica, não há justificativa para passar o dia todo de sapato. Claro que devemos usar essa ferramenta para proteger nossa sola daqueles terrenos que possam cortar ou furar o pé, mas usar das variações de solo em questão de textura e desníveis para estimular a mobilidade e força de toda a estrutura plantar, é saudável e necessário.

Evite também as meias, se a temperatura permitir. Mesmo durante as aulas de Pilates, nosso arco plantar serve como amortecedor natural e o atrito da pele com o aparelho é importante para a sensibilidade que os movimentos exigem. 

Fonte: Revista Pilates


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